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Orlando Silva grande

 

Wladimir Gramacho

 

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) tem uma responsabilidade histórica. Coube-lhe, na Câmara dos Deputados, a relatoria de um texto que aprimore o projeto de lei aprovado no Senado que busca aperfeiçoar a legislação brasileira sobre a liberdade, a responsabilidade e a transparência na internet, também conhecido como o PL das fake news (PL 2.630/20).

 

Orlando Silva já apresentou seu texto – que traz avanços –, mas a votação foi adiada por um pedido de vista coletivo. Novas negociações e ajustes são esperados. Há muita expectativa sobre a definição de novas regras de funcionamento que serão exigidas a provedores de redes sociais (como Facebook, Twitter e Instagram), de mensagens instantâneas (como WhatsApp e Telegram) e de ferramentas de busca (como Google, Bing e Yahoo).  Entre elas, a exclusão de conteúdo e de contas com desinformação.

 

Há, entretanto, uma medida simples, neutral e eficiente de enfrentamento da desinformação que não foi contemplada no texto: a exigência de que esses provedores contribuam para a educação digital de seus usuários. Isso pode ser feito com peças publicitárias sucintas que perguntem “Como você sabe que o conteúdo que você compartilha é verdadeiro?” ou com rápidos exercícios de avaliação sobre a veracidade de notícias. Em síntese, essa medida convida cada internauta a “pensar duas vezes” antes de compartilhar conteúdo na internet.

 

Trata-se de medida simples porque é de fácil implementação e exige apenas alguns poucos segundos da atenção de internautas. É neutral porque não envolve a exclusão de conteúdo, portanto não limita de nenhuma forma o direito à expressão ou à informação. E é eficiente porque, segundo estudo publicado neste ano na revista Nature, a exposição a esse tipo de conteúdo pode reduzir em até 50% o compartilhamento de fake news.

 

Essa é uma das principais conclusões de ampla revisão de literatura feita por Gordon Pennycook (University of Regina, Canadá) e David Rand (MIT, nos Estados Unidos) sobre os fatores determinantes da identificação e da crença em fake news, publicada recentemente na revista Trends in Cognitive Sciences. No estudo, eles refutam a ideia de que só pessoas muito partidárias divulgam fake news, mostram a importância de uma série de determinantes psicológicos associados a esse comportamento e sugerem abordagens para reduzir a circulação de desinformações.

 

Algumas estratégias, contudo, enfrentam limites importantes. O uso de algoritmos que detectem fake news por meio de machine learning, natural language processing e network analysis, por exemplo, tende a ter alcance reduzido, porque nem sempre é fácil classificar um conteúdo como totalmente falso ou totalmente verdadeiro. Além disso, o contexto informacional é dinâmico, e os temas que são importantes hoje podem não ser os mesmos da semana que vem. Portanto, uma semana de aprendizado para a construção dos algoritmos pode ser tempo demais.

 

Outra estratégia é confiar na ação de agências de fact-checking, que prestam uma valiosa contribuição para o enfrentamento desse problema. Entretanto, essa não é uma solução escalável. Ou seja, é impossível escrutinar com zelo e precisão todas as fake news que circulam na internet. Essas agências podem fazê-lo com algumas desinformações mais difundidas, ou compartilhadas por autoridades e influenciadores. Mas não têm condições de avaliar todo o conteúdo digital.

 

Nesse contexto, seria amplamente escalável, logisticamente simples, politicamente neutral e cientificamente recomendada a exigência de que plataformas de redes sociais, mensagens instantâneas e redes de busca exibissem de tempos em tempos a seus usuários conteúdo orientativo ou perguntas educativas que desincentivassem o compartilhamento de desinformações. No texto de Orlando Silva, a responsabilidade pelo fomento à educação foi dada só ao Estado, não ao setor privado, que explora esses serviços e lucra com eles. Mas ainda há tempo de corrigir esse lapso. O texto pode ser melhorado quando for ao plenário da Câmara dos Deputados, durante as negociações e revisões do grupo de trabalho que o analisa, ou já pela mão de seu relator.

 


 Este artigo foi publicado em 16 de novembro de 2021 no Poder360.

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